O “Fogo do Cajueiro”, tiroteio entre o bando de Zé Sereno e o Coronel Figueiredo que resultou da tentativa frustrada do primeiro de invadir a fazenda deste último, nos finais da década de 1930, já havia sido a nós narrado por idosos do povoado Sucupira, próximo a esta localidade. Com as informações dadas por S. Ebron e S. Nezinho na Sucupira, os quais nos foram apresentados pelos jovens Igor e Guigui, pensamos, nós do Projeto Memórias e eles da Mandacaru Filmes, em levar esta história para a tela do cinema, transformando-a num filme com a função de colocar Dores na “rota do cangaço”, chamando a atenção para o embate cangaço X coronelismo, pouco enfatizado nas obras mais conhecidas.
Entretanto, pairavam sobre o tema alguns questionamentos: a) Qual o horário do tiroteio, que vitimou mais de uma dezena de vacas que estavam na proximidade da casa grande? b) Por que a fazenda foi invadida? c) Por que o Coronel estava praticamente desarmado e sem a presença de jagunços nas proximidades da sede da propriedade que viessem dar proteção e obstruir a entrada dos invasores?
Dona Isaura foi peça-chave para chegarmos às respostas, vez que ela é a única personagem daquele fato ainda viva, estando sua casa nas proximidades da sede da fazenda, sendo seu irmão aquele que socorreu o Coronel e tendo uma de suas irmãs estado no interior da residência no momento do tiroteio.
Segundo Isaura Clementino, a invasão da Fazenda Cajueiro se deu por volta das 21 horas, estando o Coronel já deitado e sendo possível ver de longe o feixe de luz gerado pelas balas e ouvir o barulho dos tiros. Sobre o motivo da invasão, ela nos informa ter testemunhado o Coronel Figueiredo Porto mostrando a seu pai, João Clementino, do qual era compadre e no qual confiava, um bilhete escrito por Lampião e entregue pelo seu vaqueiro da Quixaba onde pedia alta quantia em dinheiro.
Mesmo aconselhado por João, que já tinha a experiência de ter recebido um bilhete intimidador do “Rei do Cangaço” quando residia em Triunfo (PE), a mandar o dinheiro pedido, ou parte dele, Figueiredo recusou-se a fazê-lo, o que teria motivado a investida de Zé Sereno, um dos seus lugares-tenente. “Se ele tivesse mandado o dinheiro não acontecia nada”, enfatiza nossa entrevistada.
Esclarecida a motivação do fato, veio uma revelação que elucida o último questionamento, levantado numa das conversas com a anciã. Ela nos disse que o Coronel tinha em sua residência apenas um bacamarte velho que ele usava anualmente nas festas juninas, com o qual deu o tiro que quebrou a janela da casa da fazenda invadida e iniciou o “fogo” (tiroteio) e nenhum jagunço. Numa época em que o banditismo reinava, é quase que impossível pensar como um coronel, cuja patente vinha da extinta Guarda Nacional, poderia se descuidar da segurança ao ponto de se expor a uma invasão fatal como aquela.
Continua na próxima edição...
* Por João Paulo Araújo de Carvalho
(historiador, mestre em História, professor e colaborador do Projeto Memórias) contato: joaopaulohistoria@gmail.com
* Publicado na Revista Perfil (agosto de 2011)