segunda-feira, 11 de abril de 2022

HISTORIOGRAFIA SOBRE AS PROCISSÕES DE DEVOÇÃO À PAIXÃO DE CRISTO EM N. SRA. DAS DORES: PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DE SERGIPE

Estamos na "Semana Santa", período no qual os católicos voltam-se para a reflexão sobre a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, sendo a prática penitencial uma das manifestações de fé mais evidentes nesse contexto devocional. Em Nossa Senhora das Dores, estado de Sergipe, na sexta-feira da "Semana Santa", chamada pelos católicos de "Sexta-feira da Paixão", existem procissões penitenciais, algumas centenárias, que fazem do município um espaço ímpar em todo o estado e no país. Ali ocorrem a Via-Sacra ao Cruzeiro do Século e as procissões do Senhor Morto, do Madeiro e dos Penitentes, essas duas últimas com mais de cem anos. Tal contexto votivo levou essa devoção a ser reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial de Sergipe, por meio da Lei nº 8.051, de 22 de outubro de 2015. Sobre essas manifestações de fé dos habitantes da antiga Enforcados, existem inúmeros trabalhos acadêmicos produzidos. Destacamos, a seguir, quatro escritos historiográficos que nos ajudam a compreender melhor a presença da penitência na cultura sergipana e, em especial, na dorense. Os dois estudos pioneiros foram empreendidos pelas professoras Gisselma Silva de Jesus Almeida e Magneide Santana Lima, emergindo do curso de graduação em História da Universidade Federal de Sergipe. À luz dos conceitos de campo e habitus, de Bourdieu, as referidas historiadoras buscam compreender períodos conflituosos da trajetória de procissões penitenciais que ocorrem na cidade desde o final do século XIX, em cortejos intimamente ligados à oração pela remissão dos pecados de vivos e mortos, bem como ao pagamento de alguma promessa que tenha levado o devoto a alcançar graças através do sagrado. Almeida (2002), em sua monografia “Procissão do Madeiro: devoção e diversão em N. S. das Dores entre os anos de 1992 e 1997”, estudou os conflitos internos na procissão conhecida como “Madeiro”, após a morte de seu líder e descendente da família fundadora dessa manifestação religiosa, Manoel Pajaú. Daí acabou emergindo uma nova liderança e a introdução de cenas da Paixão e Morte de Cristo no percurso da procissão, dentre outras mudanças que passaram a atrair uma multidão de curiosos, mas que, por quebrarem características da “tradição”, desagradaram aos membros mais antigos, gerando conflitos com a família dos seus criadores. Já a monografia de Lima (2002), intitulada “Penitentes de Nossa Senhora das Dores: Explosão de Fé 1990 – 2000”, aborda o crescimento no número de participantes e de acompanhantes da procissão dos “Penitentes”, num processo de atração de pessoas à cidade na “Sexta-feira Santa”, durante a década de 1990, fato que a autora associa à sua divulgação nos meios de comunicação e à quebra de uma das regras da manifestação, qual seja: a não permissão da entrada de menores de 18 anos e os embates que essa flexibilização do habitus promoveu no campo religioso local. Por sua vez, na dissertação apresentada por João Paulo Araújo de Carvalho (2019) ao Programa de pós-graduação em História da Universidade Federal de Pernambuco, que resultou no livro Uma Cruz para os Enforcados: práticas penitenciais em Nossa Senhora das Dores-SE, o autor analisa um conjunto de crenças e ritos associados à penitência e presentes em diversas manifestações religiosas que ocorrem no município na chamada “Sexta-feira Santa”, com foco nas procissões denominadas de Cruzeiro do Século, Madeiro, Senhor Morto e Penitentes, buscando compreendê-las em suas múltiplas temporalidades, embates e apropriações. Por fim, os historiadores João Paulo Araújo de Carvalho e Antônio Bittencourt Júnior (2015) foram autores do dossiê “Procissões de devoção à Paixão de Cristo em Nossa Senhora das Dores (SE)”, que embasou a solicitação encaminhada pelo Projeto Memórias à Assembleia Legislativa de Sergipe, em fevereiro de 2015, e que resultou no reconhecimento de um conjunto de procissões penitenciais que ocorrem no município na “Semana Santa” como Patrimônio Cultural Imaterial de Sergipe.